Naquela manhã de domingo, de ventos frescos e Sol brilhante, a mocinha sentada ao pé de uma laranjeira deixava o vento balançar seus longos cabelos cacheados. Inspirava o perfume doce das flores nos laranjais. Nos pés, sentia a terra fria e úmida, de onde nasciam gramíneas verdes cheia de viço, do mesmo viço que compunha a menina. Com seu coração de doze anos, acompanhava as nuvens no céu com seus grandes olhos negros. Sonhando um dia ser pássaro, e assim já era, pois coisa que mais fazia era voar.Todos os domingos costumava ir ao pomar das laranjeiras, se perder em seus pensamentos e sensações. Quantas vezes não esqueceu de voltar para o almoço. "Menina avoada! Onde é que anda essa cabeça? Quase enlouqueço!", gritava sua mãe carregando-lhe pelo punho.Naquelas manhãs era só ela e o mundo. Brincava com as folhas e os insetos das árvores, corria pelos caminhos de barro, tomava banho no riacho. Amava os domingos! "Dona Rute? A senhora já terminou a sessão. Tem outro paciente a espera.", falou a recepcionista de voz fanha. A jovem senhora abriu os olhos com o rosto estranho àquela sala fria e branca. Tinha no semblante o ar de quem acabou de voltar de uma magnífica viagem e se deparou com a rotina. Levantou-se, fechou o primeiro botão da blusa, arrumou o coque e saiu. Há anos pagava aquela analista e já se tinha dado por vencida, até aquele dia. Nossa! Foi uma experiência revigorante àquela mulher que a muito perdera o viço no olhar. Desceu as escadas do consultório ainda ofegante com todas aquelas vivas lembranças. Extasiada, entrou no carro, enfiou a chave, engatou a marcha e foi pelas ruas cinzas e barulhentas, mas em seus olhos ainda passava o filme de sua infância roubada. No percusro perguntava-se: "Mas o que eu fiz? Como deixei?". Cinquenta anos, ar sóbrio, olhar terno, mas desesperançoso.Rute que já fora uma mocinha leve, alegre como uma gazelinha, cheia de sonhos ternos, puros, corajosos... Hoje, nada mais tinha além dos fatos, afinal "adultos vivem de fatos, realidade e não de sonhos tolos!", como dizia seu pai.
segunda-feira, 28 de dezembro de 2009
Casou-se, por conveniência. Amou? Sim, conveniência também. Quatro filhos, casa grande, almoços fartos, domingos na igreja. Estava farta! Encontrava-se tão cheia dos outros, encharcada das circunstâncias alheias e seca de si mesma. Perdeu-se por um punhado de aprovação. Sempre foi vaidosa, mas uma peculiaridade dos vaidosos é que, por trás desses "pavões" há muita insegurança. Preocupava-se com o olhar do "ao redor", gostava de agradar.
"Mas como pude? Tola! Bem que papai tinha razão...", murmurava embargada. pensou tanto nos outros que esqueceu de si. Pobre Rute! Escolheu o certo e por isso errou. Preferiu o bom, o condizente, a reputação, o perfeito e assim foi arrastada.
"Devia ter sido quem sempre fui, devia ter sido corajosa, devia ter rompido!", falava alvoroçada. Com uma gargalhada concluiu: "Meu Deus! Cinquenta anos e só agora me percebo!". Um clique, uma epifania, uma grande descoberta. Chame como quiser, mas Rute se viu pela primeira vez. Percebeu que a sua infância não foi roubada por outros, mas por ela mesma. Escondeu dentro de si a verdadeira Rute, em um lugar tão profundo que nem sabia se ainda a tinha. Como uma velha roupa colorida, que tiramos do armário e a olhamos nostalgicos e felizes em revê-la, com aquela vontade de usá-la novamente e reviver a mesma sensação de um passado gostoso, de um momento especial. Era assim que Rute sentia-se. Com vontade dela mesma. Vontade de sentir-se de novo e experimentar mais uma vez o frescor de sua alma adormecida.
Desligou a chave do carro, olhou para a fachada de sua casa, respirou fundo. "Hoje trouxe-me de volta, estou feliz.", pensou, com o coração borbulhante.
Naquele dia Rute decidiu: iria ser feliz no sentido mais "incompleto" que essa palavra pode levar, pois não desejava mais ser perfeita. Amadureceu! Desejava apenas ser ela mesma. Sentir, sonhar, fazer, permitir-se ser mais humana, menos modelo, menos vitrine para os olhos sentenciosos.
Leve, revigorada, amendrontada, tremula, mas em paz. Dalí em diante verdadeiramente Rute viveu.
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Lia!!! Que coisa mais linda do mundo!!!! EU AMEI! vou pegar parte do seu texto e colocar no meu orkut, ta? de Lia..e colocar seu Blog..linda linda linda linda!
ResponderExcluirquase chorei ;~~
MUITO LINDO
bjinhooo
Lindo mesmo, viu? Sensível, vedadeiro, coisa da alma. Que bom, Lia, que vc não guarda mais essas coisas só pra si. ;**
ResponderExcluirCoisalindadaminhavida.