domingo, 14 de fevereiro de 2016

O último dos primeiros dias do ano


Um mormaço tem comprimido os corpos dos viventes.
Nó nos pés e na garganta.
A angústia tem cozinhado todos em fogo brando.

Viver numa jaula aberta é sempre mais difícil.
O litígio da decisão adormece na maioria das vezes. 
Carregar o Sol nas costas, o peso da luz, seu ardor. 

Seguir significa sempre vestir os trapos, cobrir-se de cinzas,
Lamentar e arder vivente. 
A vida é o lugar do luto. 

Enquanto as horas consomem a carne,
Pendemos tristes entre o tudo ou  nada
E nos deparamos com a melancólica lucidez desses dias. 

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Duplo

O corpo tomado de dor,
São dois habitando o mesmo espaço.
Desafiando as leis da matéria,
Fazem jus à natureza.

Imprimem-se como o corte no tronco de uma árvore.
Atravessam-se pela eternidade.
Nunca é possível apagar os vestígios do Outro.

Monumentalmente prosaico.
Ridículo.
Sublime.
É uma des-razão. 
É um sempre fim. 


terça-feira, 27 de agosto de 2013

Poética


Pensar poesia é transplantar alma às coisas.
É fazê-las transpirar.
Inanimadas, passam a ser célula.

Poesia é partir das coisas para a elas retornar
Ressignificando.

Pulsar um mundo, explodir palavras.

Verde


Eu engoli um vagalume chamado novidade.
Vagamente me pego alumiando por aí. 

domingo, 12 de maio de 2013

Nasci velha

Não tem nada mais bonito que a velhice.
Aquele estágio divino, sem data marcada.
A beleza das rugas,
O gestos firmes e quentes
De quem descobre o Tempo
E reconhece seu rosto, como num espelho.

A beleza da vida está nesse estado pleno de vazio.
Envelhecer nada mais é que reconhecer
Os erros,
As forças,
Os medos.

Morte e Vida caminham triunfantes, lado a lado.
Nós que não entendemos por onde e porque elas passam.
Morrer não é uma realidade só aos 78.

A juventude é uma estrela cadente
A velhice é um estado de graça.



Versos tão pequenos à minha grande e inspiradora Adélia, que me ensinou que o tempo não apaga a beleza, mas lapida.




terça-feira, 31 de julho de 2012

Silêncio

Sempre duvide.
Duvide dos eufóricos,
Dos que verborrageiam amor.
Palavras são apenas artifícios, fogos de artifício.
Palavra boa é aquela rara,
A que acontece em momentos súbitos, uma ou duas vezes na vida.
Duvide dos que amam de mais,
Vivem de mais,
Riem de mais.
Há sempre algo de errado em de mais.
O tão pouco basta.
O rarefeito é quem mais alimenta as almas,
naqueles instantes em que tudo que se pede é uma gota,
só uma gotinha...
a satisfação é sempre maior.

Duvide hiperbolicamente desses homens-palavras.
Meia dúzia do que entra e sai pela boca é lixo.

Por favor, não me diga o que sente.
Dizer está em outra instância, muito confusa por sinal...
Mais até que os tais sentimentos.
O dizer é raro.
Nas outras circunstâncias o que se faz é cuspir.

Desde ontem duvido desses estandartes líquidos.
O silêncio sempre me falou muito mais.


quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Arrigo Barnabé e os Tubarões Voadores.



Numas perambulâncias internéticas achei um cara que em poucos dias já considerei um gênio. Arrigo Barnabé, conhecido de nome, já tinha ouvido minha mãe cantarolar uma coisa ou outra, mas nunca tinha parado pra conhecê-lo de fato. Certo dia eu estudando sobre dodecafonismo, afim de ouvir e conhecer melhor a coisa, pego na Wikipédia uma lista de compositores dodecafônicos . No meio de um monte de nome russo, alemão e francês, o nome de um brasileiro, contemporâneo, o que me intrigou bastante. Lá estava Arrigo Barnabé e suas composições vanguardistas, experimentais e dissonantes. Mais uma vez obrigada Wikipédia por salvar a pátria! Ouvi duas ou três músicas dele no Youtube e já fiquei babando pelo cara. Pouco tempo depois, logicamente, já tava baixando uma penca de coisa.
Achei genial as composições rítmicas e melódicas, a presença das dissonâncias, a dramaticidade do texto das músicas, as sensações caóticas, o caráter quadrinhesco, o lance meio "performer" que ele apresenta nos shows. Enfim, o Arrigo é um artista daqueles que deixa a gente com um frisson estético durante dias. Mas chega de rasgação de seda. 

Esse vídeo que estou postando ilustra a história da música Tubarões Voadores, escrita e desenhada por Luiz Gê, musicada por Arrigo. Aliás, parabéns aos caras que fizeram esse vídeo, apesar de simples, ficou bem bacana. Eles fizeram uma espécie de recorte da história em quadrinho de Tubarões Voadores que vinha junto com o vinil. 

Agora falando da música em si, resumidamente, Tubarões Voadores é uma espécie de lenda urbana, onde tubarões voadores facínoras aterrorizavam uma cidade fazendo atrocidades e mantendo todos refém. Acredito que talvez no meio disso possa haver uma crítica ao regime militar, afinal o álbum é de 1984, finalzinho da ditadura. Ou pode ser só um devaneio meu mesmo e não passar de mais uma historinha sangrenta de quadrinhos. Enfim, mas fora as racionalizações, o mais legal dessa música são as sensações caóticas que a gente sente. Acho que as dissonâncias provocam um estranhamento no ouvido a um ponto de fazer você prestar atenção de fato na música, você consegue se deixar levar pelos sons. Arrigo transporta musicalmente você num labirinto de sons que te fazem sentir a balburdia de uma cidade atormentada por barulhos e medos. Bom, mas não adianta nada eu continuar a descrever, o negócio só vai  ouvindo mesmo. Até porque quem é bom mesmo nessa coisa de resenha é meu amigo George Facundo (recomendo: http://mundo-facundo.blogspot.com/). Então, espero que curtam! 

*Recomendo também: Clara Crocodilo, Diversões Eletônicas (dois hits) e Canção do Astronauta Perdido.